Parábola

[geral]

No Velho Testamento, a palavra é mashal, “uma semelhança”, e também é traduzida como “provérbio”. No Novo Testamento é παραβολἠparabolē. Uma parábola é uma forma de narração na qual algo é figurado e não expresso em seu significado exato. Consequentemente, uma parábola geralmente necessita de alguém que a explique. O Senhor disse em uma ocasião que Ele falou por parábolas, para que a multidão não entendesse Seu ensino: eles haviam efetivamente rejeitado seu Messias, e não estavam moralmente em condições de serem ensinados. O Senhor atuou como Intérprete e explicou o significado em particular a Seus discípulos, pois foi dado a eles conhecer “os mistérios do reino” (Mt 13:11). Algumas, entretanto, das parábolas do Senhor eram tão explícitas que eram entendidas até mesmo por Seus inimigos, o que sem dúvida era Sua intenção; eles foram expostos como em Sua presença. Algumas delas no Velho Testamento também eram claras, mas na parábola da cordeira, Davi não viu a aplicação até que ele mesmo tivesse se julgado o culpado. O mesmo aconteceu com Acabe e o “cativo fugitivo”. Essas alegorias foram calculadas para atingir a lição pretendida, retratando de forma objetiva o mal.

A palavra “parábola” é usada muitas vezes no Velho Testamento para linguagem figurativa onde nenhuma parábola distinta é relatada, como quando Balaão “alçou sua parábola” (Nm 23:7, 18, etc.); e Jó “prosseguindo em sua parábola” (Jó 27:1; Jó 29:1). A palavra παραβολἠparabolē é traduzida como “alegoria” (Hb 9:9) e “figura” (Hb 11:19).

Pelo fato de o Senhor conectar “os mistérios do reino” com as parábolas que proferiu, podemos ter certeza de que há muita instrução a ser obtida delas, se corretamente interpretadas: elas precisam do ensino do Espírito de Deus tanto quanto qualquer outra parte da Escritura.

Será visto pela lista anexa que algumas das parábolas são registradas apenas por Mateus; só duas “semelhanças” são encontradas apenas em Marcos; várias parábolas são fornecidas apenas por Lucas; e nenhuma foi registrada no evangelho de João. Há razões divinas para isso, e sabedoria é necessária para discernir e ter proveito com isso. Tudo está, sem dúvida, em harmonia com o caráter de cada um dos Evangelhos. A palavra “parábola” ocorre em João 10:6, mas não é a mesma palavra grega e a de João significa “alegoria” (JND) ou “comparação” (TB). O ensino não é em forma de parábola: o Senhor fala de Si mesmo como o Bom Pastor.

Algumas das parábolas estão agrupadas. Assim, em Mateus 13 há sete parábolas, quatro das quais foram faladas aos ouvidos da multidão, e três em privado. A primeira foi introdutória, a saber, a do Semeador. O Senhor veio buscando fruto, mas não encontrando nenhum, revelou que realmente havia semeado “a palavra do reino” e explicou por que grande parte da semente não produzia fruto. As próximas três parábolas dão o aspecto externo do reino durante a ausência de Cristo, aquilo que o homem fez dele. A segunda é a do Trigo e o Joio. O Senhor semeou a boa semente, mas Satanás imediatamente semeou sua semente, e as duas cresceram juntas até a colheita no final dos tempos. A terceira é a Semente de Mostarda. Esta cresce e se torna uma árvore grande o suficiente para que os pássaros (que comeram a boa semente na parábola do semeador) se alojem em seus galhos. A quarta é a do Fermento. A mulher escondeu o fermento (sempre uma figura do que é humano e, portanto, do mal, porque o pecado está na carne) que se difundiu invisível entre as três medidas de farinha até que tudo ficou fermentado.

Então Jesus mandou a multidão embora e, em particular, explicou primeiro a Seus discípulos a parábola do trigo e do joio, e então acrescentou parábolas que mostram o objetivo divino e a intenção no reino. A primeira é a do Tesouro Escondido, com respeito ao homem comprar o campo em que o tesouro está escondido. A segunda é da Pérola de Grande Valor. O mercador busca boas pérolas e, tendo encontrado uma pérola de grande valor, vende tudo o que tem para possuí-la. Cristo renunciou a tudo o que Lhe pertencia como Homem segundo a carne e como Messias na Terra, para que pudesse possuir a Igreja. A terceira é a parábola da Rede, que reúne do mar das nações bons e maus, como o evangelho fez na Cristandade. Quando a rede é puxada para a costa, os servos fazem uma seleção do bom do mau, mas no final dos tempos (é acrescentado no relato) os anjos separarão os ímpios dos justos e os lançarão na fornalha de fogo.

Outro grupo de parábolas está em Lucas 15, ou em certo sentido uma parábola em três seções (Lc 15:3). Ela responde à acusação feita contra o Senhor: “Este recebe pecadores”.

  1. A Ovelha Perdida foi seguida pelo Pastor até ser encontrada.
  2. A Dracma Perdida. A dracma foi perdida na casa, assim como muitas pessoas aos olhos de Deus se perderam na profissão externa de serem filhos de Abraão (como muitos de fato estão perdidos agora na Cristandade). A dracma perdida foi buscada com a candeia acessea até ser encontrada. Era preciosa, uma peça de prata.
  3. O Filho Pródigo foi recebido com gozo pelo pai, uma festa foi preparada e a recuperação do perdido foi celebrada com música e dança. Este é o clímax – a celebração da graça. Em todos os três, o gozo é de quem encontra. É o gozo do céu pela recuperação dos pecadores perdidos.

Sem dúvida, é melhor estudar cada parábola ou cada grupo, com seu contexto, como o Espírito Santo os deu. No entanto, foram feitas tentativas de classificá-las de acordo com a verdade transmitida por elas, assim:

  1. A colocação de Israel a um lado.

Os Dois Filhos, dos quais o Senhor dá a interpretação.

Os Lavradores Maus: os governantes de Israel estavam entre os ouvintes do Senhor, e Ele explicou a parábola assim: “o Reino de Deus vos será tirado e será dado a uma nação que dê os seus frutos”.

A Figueira Sem Fruto: o Senhor veio buscar fruto em Israel como representante sobre a lavoura, mas não encontrou nenhum. Ele deu tempo para o arrependimento, mas a figueira não deu fruto e estava para ser cortada: a destruição de Jerusalém foi a sua efetiva remoção.

  1. A introdução do reino e a oposição de Satanás a ele.

O Semeador, o Trigo e o Joio.

O Crescimento da Semente de Mostarda: apesar da oposição de Satanás, Deus em Seu próprio caminho secreto faz Sua semente frutificar e dar frutos.

O Fermento; o Tesouro Escondido; a Pérola de Grande Valor; e a Rede.

  1. A maneira de Deus abençoar. A Ovelha Perdida; a Dracma Perdida; e o Filho Pródigo. As Bodas do Filho do Rei: Deus honrará Seu Filho. Os judeus foram convidados para a festa, mas não quiseram vir. Outros, os marginalizados gentios, foram convidados. Alguém sem o manto nupcial (sem Cristo) foi expulso. Ele não tinha nenhum senso de incapacidade natural.

A Grande Ceia: a festa da graça celestial em contraste com as coisas terrenas do reino de Deus. Todos os que foram convidados deram desculpas, não como impedidos pelo mal, mas pelas coisas terrenas; eles foram indiferentes ao convite gracioso. Alguns, os pobres e aflitos da cidade, foram introduzidos e outros foram compelidos a entrar. Deus deseja que Sua casa se encha.

O Fariseu e o Publicano: o fariseu agradecia a Deus por não ser como os outros homens; o publicano clamou por misericórdia e desceu justificado para sua casa e o fariseu não.

Os Dois Devedores: a pobre mulher foi muito perdoada e muito amou; não foi perdoada porque ela amou muito.

O Juiz Injusto e a Viúva Insistente: o ponto do Senhor era ensinar aos homens “o dever de orar sempre e nunca desfalecer”. Deus responderá em Seu próprio tempo, e os eleitos terrenais serão salvos.

Os Trabalhadores na Vinha: Deus em Sua soberania pergunta: “não Me é lícito fazer o que quiser do que é Meu?” O homem reivindica essa liberdade para si mesmo, mas murmura contra a soberania de Deus. “Muitos são chamados, mas poucos escolhidos”. Observe também nesta parábola a resposta do Senhor à pergunta de Pedro em Mateus 19:27: Mateus 20 continua o assunto e nos mostra a graça soberana em contraste com o espírito interesseiro do coração do homem.

  1. As várias responsabilidades dos homens.

O Bom Samaritano: isto foi dado em resposta à pergunta: “Quem é o meu próximo?” O Senhor era realmente o Bom Samaritano e, depois de descrever a conduta que tomou, disse: “Vai e faze da mesma maneira”.

O Rico Tolo: a moral é: “Assim é aquele que para si ajunta tesouros e não é rico para com Deus”.

O Mordomo Injusto: sacrificou o presente pelo futuro, pelo que seu mestre o elogiou, não por sua injustiça, mas por sua sabedoria. O Senhor aplica a parábola assim: “granjeai amigos com as riquezas da injustiça (posses mundanas), para que, quando estas vos faltarem, vos recebam eles nos tabernáculos eternos”. Dar aos pobres é emprestar ao Senhor e acumular tesouros no céu. O Senhor exortou Seus ouvintes a serem (ao contrário do mordomo injusto) fiéis em sua mordomia das riquezas injustas (que não pertencem ao Cristão), para que as verdadeiras riquezas lhes sejam confiadas.

O Rico e Lázaro. Nada é dito sobre o caráter moral de qualquer um desses homens. Foi ensinado no Velho Testamento que a prosperidade exterior deve marcar o homem justo (Sl 112:2-3). No reino em sua nova fase, consequência da rejeição de Cristo, a posse de riquezas não é sinal do favor divino. Esta foi uma lição necessária para o judeu. Era muito difícil para um homem rico ser salvo, mas os pobres tinham o evangelho pregado a eles. O pobre foi carregado para o seio de Abraão e o rico caiu na perdição. Outro mundo inverte as condições do atual. O ensino da parábola do mordomo injusto é continuado aqui: o homem rico não estava sacrificando o presente pelo futuro. Também dá uma imagem vívida da condição inalterável dos perdidos.

O Servo Malvado. Isso ilustra o governo de Deus, que não é colocado de lado por Sua graça. É revelado que Deus recompensará Seu povo de acordo com a atitude deles para com os outros (Mt 7:2). Sem dúvida, esta parábola tem outra aplicação, relacionada aos judeus quanto ao seu ciúme da graça sendo mostrada aos gentios. A dívida dos gentios para com eles é expressa em 100 “dinheiros” ou “denários” (cerca de 3,23 libras esterlinas); ao passo que a dívida dos judeus para com Deus é vista nos 10.000 talentos (1.937.500 libras esterlinas)156. O perdão foi oferecido a eles por Pedro em Atos 3:19-26; mas foi rejeitado, e a perseguição deles a Paulo e aos que levavam o evangelho aos gentios mostrou que eles não podiam perdoar os 100 denários aos gentios. Eles agora devem pagar até o último centavo (compare Is 40:2; Mt 5:25-26; 1 Ts 2:15-16).

As Dez Virgens. A explicação disso é simples. A atitude normal dos Cristãos é que eles saíram para encontrar o Noivo. Essa era a esperança e expectativa dos apóstolos. Depois de seus dias, tudo a esse respeito adormeceu. Pode ter havido tempos de despertamento, mas quando a última chamada é feita, ela revela o fato solene de que alguns têm apenas uma profissão, sem Cristo – lâmpadas sem azeite – que serão excluídos para sempre. “Vigiai, pois, porque não sabeis o dia nem a hora”. As virgens significam Cristãos, e não o remanescente judeu fiel, pois estes não dormirão (a perseguição impedirá isso), nem serão uma companhia mista, nem terão que esperar muito pelo seu Libertador.

Os Talentos. Esta parábola é semelhante em caráter à das minas. Os talentos eram distribuídos de acordo com a habilidade de cada servo, de forma que um tinha cinco, outro dois e outro um. Esta parábola segue a das Dez Virgens, mostrando que enquanto o Cristão espera por seu Senhor, ele deve usar fielmente os dons que lhe foram confiados.

As Minas mostram o Senhor Jesus deixando a Terra para receber um reino e dando a cada um de Seus servos uma mina para negociar durante Sua ausência. Todos os dons são para a glória do Senhor, e o servo é responsável perante Ele pelo uso fiel deles.

Outro arranjo das parábolas principais foi sugerido, a saber, em três grupos, correspondendo a diferentes períodos do ministério do Senhor:

  1. Em Seu ministério inicial, abraçando o novo ensino conectado com o reino, e a forma misteriosa que assume durante Sua ausência. Isso se estende a Mateus 13 e Marcos 4. Essas parábolas serão facilmente distinguidas na tabela a seguir.
  2. Após um intervalo de alguns meses. As parábolas agora são de um tipo diferente e foram baseadas na vida dos homens, e não no mundo da natureza. Elas são principalmente em resposta a perguntas, não em discursos para a multidão. A maioria delas ocorre apenas em Lucas, no qual o evangelho do Filho do Homem é para o homem. Elas se localizam principalmente entre a missão dos setenta e a última ida do Senhor a Jerusalém.
  3. Este grupo se localiza no final do ministério do Senhor. Elas dizem respeito ao reino em sua consumação e são proféticas sobre a rejeição de Israel e a vinda do Senhor.

Em Mateus 13, o Senhor perguntou a Seus discípulos se eles entendiam o que Ele estava dizendo a eles. Eles disseram: “Sim, Senhor”. Ele acrescentou: “Por isso, todo escriba instruído acerca do Reino dos céus é semelhante a um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas”.



[156]

N. do T.: Apenas para comparação, considerando que o denário era o salário de um dia de trabalho e que o Salário Mínimo em 2021 é de R$ 1.100,00, o denário valeria hoje R$ 36,67 e a dívida do conservo seria de R$ 3.667,00. O Talento valia 6.000 denários e 10.000 talentos equivaleriam a cerca de R$ 2.200.000.000,00, ou seja a dívida do servo malvado era 600 mil vezes maior do que a do seu conservo.